segunda-feira, 5 de maio de 2014

Poema

Poema (para A.)


Nunca te procurei
Mas encontrei-te
Foste sempre tu e serás
Mesmo com as tuas falhas e falhanços

Também me encontraste
Já era amor antes de ser
Nem se guardam a sete chaves
Segredos etéreos que têm vontade própria

Mas não preciso que me completes
Só quero que me transbordes
Sou já completa na minha incompletude
Somos a vírgula um do outro
A única possibilidade de matarmos
As saudades infinitas que nos tiram o sono
Somos a possibilidade de transbordo um no outro
Se a desperdiçamos morreremos por muito pouco.


 Helena Simões da Costa ©


terça-feira, 29 de abril de 2014

Poema: Canto do Coração


Poema "Canto do Coração" (para A.)


Desde há uns dias atrás que um pássaro de cantar sentido e doce
Vem todas as noites à minha janela encantar-me com um sublime chilrear
Será uma suave melodia da boa nova? Será o pássaro dos bons-ventos?
Que pássaro será este? De onde vem? Ao que vem?
Que quererá ele da minha janela? Será pela minha luz?
Que quererá ele de mim? Trará ele notícias do meu amor?
Será um anjo? O meu anjo? Anjo selvagem? Ou só um selvagem?
Escreverá sobre o tempo? Inventou ele uma canção só para mim?
Será que está a apurá-la para me impressionar mais ainda?
Será um ensaio ou a versão final? Será a canção só para mim?
Onde estará ele nas outras horas? A compor para mim?
Serei a sua musa encantada? A sua sereia com pernas?
Gostará ele dos meus cabelos esvoaçantes de ave-do-paraíso?
Saberá ele que a sua melodia é a única que escuto?
Virá ele adormecer-me? Virá ele pôr-me a filosofar? Ou a poetar?
Será que ele quer que eu o pinte? Quererá ele um retrato abstracto?
Será uma mania de um pássaro louco? Saberá ele que sou selvagem?
Será uma fixação em mim? Será um pássaro passarengo?
Poderá ele estar a vigiar e a proteger a minha janela?
Será que só agora ele descobriu que eu falo a língua dos pássaros?
Quererá ele que eu lhe cante também?
Será um ritual noctívago? Será que caiu nele? Será uma negaça?
Estará ele a pedir-me comida? Será carnívoro?
Saberá ele que eu já corri com todas as moscas e melgas?
Será que ele me vem agradecer? Será por eu também ter asas?
Será por eu também ser pássaro? Será por ele gostar de olhos verdes?
Ou será apenas um pássaro que se perdeu do bando? Quererá ele uma bússola?
Saberá ele que quando canta está no bom caminho?
Estará ele a deleitar-se a exibir a voz de pássaro?
Terá ele roubado o cantar a outro pássaro? Terá vindo da Floresta Negra?
Será ele um pássaro fenomenólogo da poesia e do canto?
Será que ele lê e se inspira em Virginia Woolf? Ou será Fernando Pessoa?
Será que de noite o meu amor se transforma em pássaro?
Só para me vir cantar e ver-me aflorar à janela?
Gostará ele de flores? Saberá ele que eu sou uma flor?
Gostará ele de orquídeas ou de verbena? Ou de rosmaninho e jasmim?
Saberá o pássaro que já antes de me aparecer à janela eu ouvia a sua música?
Será o pássaro a ganhar coragem para me declarar o seu amor?
Será que eu sou a sua estrela guia? Saberá ele que eu sou uma estrela?
Será que o pássaro se chama 'canção de embalar'?
Será uma espécie em extinção? Será que ele me quer levar?
Será que o seu canto é de medo? Ou de coragem?
Será que o pássaro finalmente me encontrou?

Saberá ele que mesmo em silêncio eu ouço o seu cantar?

Será que o pássaro já percebeu que só gosta de me dar música a mim?
Terá o pássaro percebido que eu sou a sua canção? E que me canta só a mim?

Saberá ele que sou a sua doce canção, o seu cantar e o encanto do canto que cai em mim?
Afinal o pássaro fenomenólogo é mesmo o meu Amor
E finalmente chegou sem medos para dar música ao meu coração.


Helena Simões da Costa ©

segunda-feira, 21 de abril de 2014

Poema: Declaração de Amor I

 
Vem

Já sou completa
Não preciso de ti para nada

Mas
Sem saber explicar porquê
Preciso de ti como de mais ninguém

Vem

Sem teres
Apenas a seres
Só tu
Nu
Na tua sublime solidão

Vem
Amor

Traz-me o teu azul

A verdade libertar-te-á.



Helena Simões da Costa ©

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Fenomenologia do Amor I


A excelência do Amor está no ocultamento

Na espera da beleza envergonhada da lua

Que aguarda ansiosa a eterna florescência

Com a ajuda do vento quente

Que lentamente

Escancara a porta da verdade

De onde apareço eu

Ao alto

A sussurrar-te
 
A

M

O


T

E
.


Helena Simões da Costa ©

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Anamnese do Amor II


A saudade?



A saudade é o sinal exclusivo e original

Vindo do índigo céu que desperta

A minha intuição sempre à tua espera

Neste lugar puro sem tempo e sem espaço

Criado e cuidado pela alma do Universo

Para nos orientar até à nossa essência



É ter alguém gravado no espírito da carne

Anímica a expelir o enfado das imitações

Mas a esperar o seu original exclusivo



É um fluxo de correntes de electricidade no ar regressadas

Do destino lido nos nossos olhos siderados na mnemónica

Das estrelas que exaltadas nos desenham a ouro no deserto 



É a vertical e ondulante linguagem do espírito

Ígneo que produz diálogos do silêncio que desconstroem

Um verbo visível sem história para erguer o do coração



É o prumo do afecto que evolui a ilimitado bem-querer

Que viaja em correntes de ar sem se dispersar

Das profecias do vento que contêm o futuro já visto.


A saudade é O farol. 


Helena S. Costa ©

(photo credits: Mars & Spica © P-M Hedén in http://apod.nasa.gov/apod/ap140402.htm)

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Anamnese do Amor I



A ternura?



A ternura é aquele olhar trovejante


Que trocámos há muito tempo e que se desvenda


No desejo imutável e imemorial


Das nossas mãos se tocarem no subtil silêncio


Habitado pelas nossas almas fulgurantes.



Helena S. Costa ©